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Peço desculpas aos leitores do meu blog pela minha insistência em abordar um tema que já está amplamente noticiado na mídia. Refiro-me ao ENEM 2010 que voltou a valer após decisão do Presidente do Tribunal Federal de Recursos (TRF) do Ceará, que revogou a liminar que o havia suspendido. Ao justificar sua decisão, o desembargador presidente do TRF do Ceará, alega que:
i) a suspensão de um certame envolvendo mais de 3 milhões de estudantes traria transtornos de monta aos organizadores e ao erário, da ordem de R$ 180 milhões, decorrente da contratação da logística necessária à realização de um novo exame;
ii) aos candidatos de todo o Brasil;
iii) que a alteração do cronograma do Enem repercutiria na realização dos vestibulares promovidos pelas instituições de ensino superior, porquanto diversas dessas entidades utilizarão as notas do Enem, fatos que possibilitariam a ocorrência de grave lesão à ordem administrativa; e
iv) que a decisão do Juízo Federal cearense, louvada em eventual irregularidade nas provas de menos de 0,05% dos candidatos, equivalente a 2.000 estudantes, finda por prejudicar todos os demais (cerca de 3.000.000), afrontando o princípio da proporcionalidade.
Evidentemente que haverá recurso dessa nova decisão, e o ENEM 2010 ainda não está livre de ser anulado. Tanto a Defensoria Pública da União como o Ministério Público Federal já se manifestaram afirmando que devem recorrer da decisão do Presidente do TRF/CE.
Não há dúvida nenhuma que o ENEM 2010 deve ser anulado. Apesar de chamar exame, o ENEM se transformou em um concurso, eis que seleciona candidatos para ingresso diretamente às vagas em algumas universidades federais. Só por isso, deveria garantir o direito de igualdade estabelecido em nosso texto constitucional. Os quatro motivos principais que motivaram a sentença do Presidente do TRF/CE, não justificam a continuidade de um concurso eivado de irregularidades, mesmo que garantido o direito dos eventuais prejudicados de fazer nova prova.
A decisão foi política e não jurídica. Prova isso, que o Ministro da Educação foi previamente ouvido pelo Presidente do TRF/CE, direito não concedido ao representante do Ministério Público Federal, numa afronta aos princípios Constitucionais do Processo Civil - Igualdade processual, contraditório e ampla defesa, que devem garantir a bilateralidade da manifestação dos litigantes, pontuando desse equilíbrio o denominado princípio da igualdade das partes, tão importante para o embate processual quanto qualquer um dos demais princípios orientadores do processo.
Inúmeros concursos de igual natureza do ENEM foram anulados por razões da mesma natureza.
Prova isso, recente exame da OAB (o primeiro realizado nacionalmente), que foi anulado em face de uma denúncia de eventual quebra de sigilo ocorrida na Seccional de São Paulo. A o decidir pela anulação daquele exame, o presidente nacional da OAB afirmou: ““Não consta anulação parcial de uma prova nacional. Se vazou em um lugar, pode ter vazado em outro. É melhor pecar pelo excesso do que pela omissão”.
Neste caso, como no ENEM 2010, a OAB como organizadora do exame teve que arcar com o custo da realização de uma nova prova e muitos candidatos que a realizaram, e eventualmente poderiam ter sido aprovados sem ter acesso aos eventuais gabaritos das questões, foram obrigados a fazer nova prova, e assumir o risco, dessa vez, de não ser aprovado.
Entendemos, salvo melhor juízo, que o princípio da proporcionalidade utilizado para justificar a decisão do Presidente do TRF/CE não o libera para manipular as regras do Direito de maneira a retirar-lhe os efeitos não pretendidos ou assumidos por ela própria.
Assim, considerando que o ENEM hoje é um concurso (público), cuja finalidade principal é de possibilitar aos candidatos a obtenção de uma vaga em uma universidade pública, a Administração Pública, como agente organizadora, deve primar pela observância dos princípios da moralidade, eficiência e aperfeiçoamento, ao mesmo tempo em que deve propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei. Uma nova prova aos candidatos que foram prejudicados, evidentemente não irá garantir que todos os candidatos foram tratados com igualdade.
Por essa razão, o próprio Ministério da Educação deveria anular o ENEM 2010, assimilando o seu dever de corrigir as falhas apontadas - que naturalmente ocorre em tudo o que é obra humana -, ao invés de buscar desculpas e subterfúgios nebulosos e pouco convincentes para um erro cometido, deixando que a questão para a defesa do direito dos candidatos, eventualmente prejudicados, seja direcionada para a esfera judicial como única via restante e possível.
Voltando a repetir que o ENEM hoje deve ser considerado uma espécie de concurso público, o direito de igualdade de acesso está consubstanciado na própria regra que o estabelece, não podendo ser aplicado o princípio da proporcionalidade, mesmo que apenas um dos candidatos alegue e comprove que lhe tenha sido negado o direito de participar em igualdade de condições que os demais.
Se o Ministério da Educação e o Presidente do TRF/CE não estão convencidos disso, basta que vejam as repercussões que o assunto está tomando na mídia e no seio da sociedade, especialmente nos próprios interessados – os estudantes-, que ontem realizaram manifestações contra as irregularidades ocorridas no ENEM 2010 em várias cidades.
Concluímos com a frase de Augusto Cury:
Fonte:“Sábio é o ser humano que tem coragem de ir diante do espelho da sua alma para reconhecer seus erros e fracassos e utilizá-los para plantar as mais belas sementes no terreno de sua inteligência”.
1. Cópia da decisão pode ser obtida no endereço: http://www.trf5.jus.br/noticias/anexos/DecisaoENEM2010.pdf
2. Movimento dos Estudantes contra o ENEM 2010 - http://click.uol.com.br/?rf=educacao_home_manchete&u=http://educacao.uol
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