ou mais?
Recebi
por e-mail ( quem me enviou foi Marisa Brandimarti) um texto de Regina de
Castro Pompeu, terceira colocada no Prêmio Longevidade Bradesco de Jornalismo,
Histórias de Vida, com o texto: De repente, 60?
A
autora apresenta o seu texto da seguinte maneira:
De forma despretensiosa, inscrevi um
texto no concurso Premios Longevidade Bradesco Histórias de Vida.
Estou chegando de São Paulo, onde fui
participar da premiação.
Mandaram um motorista me buscar e me
trazer e fiquei num super-hotel nos Jardins, acompanhada de meu príncipe
consorte rsrsrssr.
Entre quase 200 concorrentes, conquistei
o 3o lugar, com direito a troféu e diploma.
Mas, sinto como se tivesse recebido o
Oscar, pois os primeiros colocados foram
jovens que trabalharam por alguns anos para escrever histórias que
mereciam ser contadas.
Meu texto foi o único produzido pela
própria protagonista.
O tema central era o realcionamento
inter-geracional.
Quase caí da cadeira quando Nicete
Bruno, jurada especial me perguntou: "Você é a Regina? Queria muito
conhecê-la. Adorei seu texto!!"
Tive, ainda, o privilégio de ser
fotografada ao lado da convidada especial, Shirley MacLaine.
É muita emoção, que gostaria de
compartilhar com vocês.
Abaixo, o texto premiado.
Beijos
Regina
Vamos
ao texto de Regina:
DE
REPENTE 60 (ou 2x30)
Ao
completar sessenta anos, lembrei do filme ?De repente 30?, em que a
adolescente, em seu aniversário, ansiosa por chegar logo à idade adulta,
formula um desejo e se vê repentinamente com trinta anos, sem saber o que
aconteceu nesse intervalo.
Meu
sentimento é semelhante ao dela: perplexidade.
Pergunto
a mim mesma: onde foram parar todos esses anos?
Ainda
sou aquela menina assustada que entrou pela primeira vez na escola, aquela
filha desesperada pela perda precoce da mãe; ainda sou aquela professorinha
ingênua que enfrentou sua primeira turma, aquela virgem sonhadora que entrou na
igreja, vestida de branco, para um casamento que durou tão pouco!Ainda sou
aquela mãe aflita com a primeira febre do filho que hoje tem mais de trinta
anos.
Acho
que é por isso que engordei, para caber tanta gente, é preciso espaço!
Passei
batido pela tal crise dos trinta, pois estava ocupada demais lutando pela
sobrevivência.
Os
quarenta foram festejados com um baile, enquanto eu ansiava pela aposentadoria
na carreira do magistério, que aconteceu quatro anos depois.
Os
cinquenta me encontraram construindo uma nova vida, numa nova cidade, num novo
posto de trabalho.
Agora,
aos sessenta, me pergunto onde está a velhinha que eu esperava ser nesta idade
e onde se escondeu a jovem que me olhava do espelho todas as manhãs.
Tive
o privilégio de viver uma época de profundas e rápidas transformações em todas
as áreas: de Elvis Presley e Sinatra a Michael Jackson, de Beatles e Rolling
Stones a Madonna, de Chico e Caetano a Cazuza e Ana Carolina; dos anos de
chumbo da ditadura militar às passeatas pelas diretas e empeachment do
presidente a um novo país misto de decepções e esperanças; da invenção da
pílula e liberação sexual ao bebê de proveta e o pesadelo da AIDS. Testemunhei
a conquista dos cinco títulos mundiais do futebol brasileiro (e alguns vexames
históricos).
Nasci
no ano em que a televisão chegou ao Brasil, mas minha família só conseguiu
comprar um aparelho usado dez anos depois e, por meio de suas transmissões,vi a
chegada do homem à lua, a queda do muro de Berlim e algumas guerras modernas.
Passei
por três reformas ortográficas e tive de aprender a nova linguagem do
computador e da internet. Aprendi tanto que foi por meio desta que conheci, aos
cinquenta e dois anos, meu companheiro, com quem tenho, desde então,
compartilhado as aventuras do viver.
Não
me sinto diferente do que era há alguns anos, continuo tendo sonhos, projetos,
faço minhas caminhadas matinais com meu cachorro Kaká, pratico ioga, me
alimento e durmo bem (apesar das constantes visitas noturnas ao banheiro),
gosto de cinema, música, leio muito, viajo para os lugares que um dia sonhei
conhecer.
Por
dois anos não exerci qualquer atividade profissional, mas voltei a orientar
trabalhos acadêmicos e a ministrar algumas disciplinas em turmas de
pós-graduação, o que me fez rejuvenescer em contato com os alunos, que têm se
beneficiado de minha experiência e com quem tenho aprendido muito mais que
ensinado.
Só
agora comecei a precisar de óculos para perto (para longe eu uso há muitos
anos) e não tinjo os cabelos, pois os brancos são tão poucos que nem se percebe
(privilégio que herdei de meu pai, que só começou a ficar grisalho após os
setenta anos).
Há
marcas do tempo, claro, e não somente rugas e os quilos a mais, mas também
cicatrizes, testemunhas de algumas aprendizagens: a do apêndice me traz
recordações do aniversário de nove anos passado no hospital; a da cesárea marca
minha iniciação como mãe e a mais recente, do câncer de mama (felizmente
curado), me lembra diariamente que a vida nos traz surpresas nem sempre
agradáveis e que não tenho tempo a perder.
A
capacidade de fazer várias coisas ao mesmo tempo diminuiu, lembro de coisas que
aconteceram há mais de cinquenta anos e esqueço as panelas no fogo.
Aliás,
a memória (ou sua falta) merece um capítulo à parte: constantemente procuro
determinada palavra ou quero lembrar o nome de alguém e começa a brincadeira de
esconde-esconde. Tento fórmulas mnemônicas, recito o alfabeto mentalmente e
nada! De repente, quando a conversa já mudou de rumo ou o interlocutor já se
foi, eis que surge o nome ou palavra, como que zombando de mim...
Mas,
do que é que eu estava falando mesmo?
Ah,
sim, dos meus sessenta.
Claro
que existem vantagens: pagar meia-entrada (idosos, crianças e estudantes têm
essa prerrogativa, talvez porque não são considerados pessoas inteiras),
atendimento prioritário em filas exclusivas, sentar sem culpa nos bancos
reservados do metrô e a TPM passou a significar ?Tranquilidade Pós-Menopausa?.
Certamente
o saldo é positivo, com muitas dúvidas e apenas uma certeza: tenho mais passado
que futuro e vivo o presente intensamente, em minha nova condição de mulher
muito sex...agenária!
Cara Regina,
Vamos pensar como Maurice Chevalier:
"Envelhecer não é tão ruim, se considerarmos a alternativa.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Agradecemos seu comentário. Críticas serão sempre aceitas, desde que observado os padrões da ética e o correto uso da nossa língua portuguesa.