STF e jornalismo buldogues
O leitor é sempre o melhor termômetro para medir a temperatura da sociedade. Em meu último artigo fiz uma radiografia da corrupção e defendi três prioridades no combate aos malfeitos: cobrar dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento do mensalão, focar as coberturas jornalísticas nos casos emblemáticos de corrupção e instituir o Placar da Corrupção, um infográfico com a situação dos casos mais vistosos de pilhagem do dinheiro público.
Recebi uma enxurrada de e-mails de leitores de várias cidades brasileiras. Uma forte amostragem de opinião pública. Um denominador comum esteve presente em todas as mensagens: as pessoas não admitem o não julgamento do mensalão, com a consequente consagração da impunidade. Ao mesmo tempo, afirmam que o trabalho investigativo da imprensa deve continuar e aprofundar.
Chegou a hora do STF. Como escrevi neste espaço opinativo, julgar o mensalão não é uma questão de prazos processuais. É um dever indeclinável. Se o STF carimbar o mensalão com a prescrição, hipótese gravíssima, mas provável, concederá, na prática, um passaporte para a institucionalização da bandalheira.
A desqualificação do mensalão é essencial para aqueles que se apropriaram do Estado brasileiro. O primeiro sinal do desmonte do mensalão foi dado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ao deixar o governo, ele disse que sua principal missão, a partir de janeiro de 2011, seria mostrar que o mensalão "é uma farsa". A "farsa" a que se referia Lula derrubou ministros do seu governo, destituiu dezenas de diretores de estatais e mandou para o espaço a cúpula do seu partido. Encurralado, o então presidente só não caiu graças ao tamanho da incompetência da oposição.
Réus do processo passaram a ocupar postos altos nas estruturas dos Poderes. João Paulo Cunha (PT-SP) foi eleito presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. José Genoino foi nomeado assessor especial do Ministério da Defesa, então comandado por Nelson Jobim, ex-presidente do STF. José Dirceu - "o chefe da quadrilha", segundo escreveu o então procurador-geral da República na denúncia em que acusou a antiga cúpula do partido de Lula e de Dilma de se ter convertido numa "organização criminosa" - transita com desembaraço pelos corredores do poder.
Está nas mãos da Suprema Corte assumir o papel histórico de defesa da democracia e dos valores republicanos ou - Deus não queira - virar as costas para a cidadania. A sociedade tem o direito de confiar no ministro Joaquim Barbosa, relator do mensalão. Ele saberá honrar sua toga e sua biografia. Os brasileiros esperam que os ministros respondam à indignação da cidadania.
Paira no ar, no entanto, um clima de decepção e desencanto, fruto direto da impunidade. Em nome do amplo direito de defesa, importante e necessário, a efetivação da justiça acaba se transformando numa arma dos poderosos de turno e numa sistemática frustração das esperanças dos mais desprotegidos.
Aplicam-se ao pobre os rigores da lei e se concedem ao rico as vantagens dos infinitos recursos que o Direito reserva aos que podem pagar uma boa defesa. É duro, mas é assim.
O esforço investigativo da imprensa está contribuindo para restabelecer o equilíbrio nas relações sociais. Para o jornalismo verdadeiramente ético e independente, não há distinções e imunidades. Os holofotes da mídia têm projetado fachos de luz em zonas turvas do poder. Incomoda? É claro. E deve ser assim. Jornalismo chapa-branca não contribui com a democracia. É preciso que exista certa tensão entre imprensa e governos. No entanto, a memória do cidadão - a minha e a sua, caro leitor - não é das mais fortes. E a vertiginosa sucessão de delitos acaba sendo importante aliada do esquecimento. Não basta denunciar. É preciso focar e perseverar num autêntico jornalismo de buldogues.
É dever ético da imprensa promover uma ampla conscientização da relevância que os cargos públicos têm e da importância de que pessoas absolutamente idôneas os ocupem. Nós, jornalistas, devemos rasgar as coloridas embalagens do marketing e mostrar a realidade. Com suas luzes e suas sombras.
Entusiasmaram-se os leitores com a possibilidade de se criar um Placar da Corrupção. Não deixemos a peteca cair! Façamos um periódico mapa dos escândalos: o que aconteceu com os protagonistas do banditismo, as ações concretas ou as omissões dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Não se trata de transformar a imprensa num contrapoder, mas numa instância, talvez a única, talvez a última, de uma sociedade abandonada por muitas de suas autoridades.
Inauguremos, também, o Mapa das Promessas. É muito fácil. Basta recorrer aos arquivos e bancos de dados. Os políticos, pródigos em soluções de palanque, não costumam perder o sono com o rotineiro descumprimento da palavra empenhada. Afinal, para muitos deles, infelizmente, a política é a arte do engodo. Além disso, apostam na amnésia coletiva. Ao jornalismo de qualidade, desengajado e independente, cabe assumir o papel de memória da sociedade.
As coberturas não podem ser pautadas pelas assessorias de comunicação dos políticos, e sim pelo interesse do cidadão. Vamos falar do futuro, dos projetos, dos planos. Mas vamos também falar do passado, das coerências e das ambiguidades. E, sobretudo, não nos deixemos seduzir pelas estratégias do marketing que ameaçam transformar a política num show de chavões populistas e num triste espetáculo de inconsistência.
A corrupção é um câncer que deve ser enfrentado por todos: jornalistas, magistrados e cidadãos. Chegou a hora do STF e do jornalismo de buldogues. Chegou a sua hora, amigo leitor.
FONTE:
O ESTADO DE SÃO PAULO
Autor do Texto – Carlos Alberto Di Franco,Doutor em Comunicação, Professor de Ética e Diretor Master em Jornalismo
Publicado no Portal da CM Consultoria
http://www.academus.pro.br/site/pg.asp?pagina=detalhe_artigo&titulo=Artigos&codigo=2042
Leia o artigo, repasse para todos os seus contatos, e participe de todos os movimentos que estão surgindo para pedir o julgamento daquele caso.
O artigo do jornalista Carlos Alberto Di Franco, é um alerta para a sociedade brasileira. Não podemos deixar que o STF deixe de julgar, o mais rápido possível, o mensalão. Deixar que os autores fiquem impunes pela prescrição dos crimes cometidos será, certamente, um soco na cara de cada um dos brasileiros.
Vamos reagir, ainda dá tempo.
Vamos reagir, ainda dá tempo.
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