Para saber o que é camongoso você precisa ler a história contada por um advogado do Rio Grande do Sul.
Ele conta que um dia:
A secretária do meu escritório, em cidade do Norte gaúcho, avisou-me que chegara uma senhora querendo falar comigo, mas que só conversaria em particular. Mandei que entrasse.
Estendi a mão num cumprimento cordial. Ela era uma pessoa humilde, deu para perceber que não tinha maldade no coração. Ela se apresentou:
- Sou Juvenilda... (o nome, aqui, é fictício - para preservar o sigilo na essência da história, que é real).
- Em que posso ajudar? - perguntei.
- O problema é de separação. Meu marido João chega em casa, todo dia, na "manguaça" e se eu reclamo ele ainda me dá um "tundão”.
Perguntei se fazia tempo que isso vinha acontecendo.
- Faz mais de ano, doutor!
- Por que a senhora já não comunicou na polícia?
- É que eu gosto dele, doutor.
- Mas dona Juvenilda, se gosta de um homem que é "manguaça" e ele lhe bate todo dia, então a senhora não precisa de advogado...
E ela prontamente completou:
- Mas o caso é maior. Tem também as "camangas" que vão lá em casa, atrás dele. Agora quero a separação!
Entendido o problema, comecei o trabalho. Fiz a petição inicial contando a história da Juvenilda e encaminhei o pedido de separação judicial. Marcada a audiência, juntos - Juvenilda e eu - fomos ao foro. Ela parecia uma gata borralheira. Chamadas as partes, entramos; já estavam na sala o juiz e o promotor.
O João entrou com o terno do casamento, o colarinho da camisa sobreposto à gola do casaco, um palito nos dentes, jeitão de galã barato de novela. O juiz ouviu primeiro a autora, que repetiu a história escrita na petição, detalhando as "manguaças", os "tundões" e as "camangas".
O magistrado dirigiu-se ao réu:
- O senhor tem alguma coisa a declarar, seu João?
Malandro de botequim, já conhecedor dos códigos, o homem respondeu:
- Excelência, quanto às "manguaça" e os "tundão" ela mesmo disse que não se importa e me deu o perdão tácito. Agora quanto às "camangas" até vou explicar: é que eu não queria casar, mas ela insistiu muito. Eu falei pra ela: ´quer casar eu caso, mas tu tens que saber que eu sou um cara camangoso, e mesmo assim ela topou´. Mas, doutor, de repente eu posso mudar, acabamos com esse processo e voltamos pra casa juntos.
O juiz olhou para dona Juvenilda e perguntou se ela queria continuar com o processo. A mulher abriu um leve sorriso:
- Eu quero ele de volta!
Encerrada a audiência, os dois saíram de mãos dadas.
O juiz, o promotor e eu - advogado gratuito, no caso - ficamos alguns minutos tentando entender qual a exata definição da expressão "camangoso".
Após algumas confabulações, concluímos que deveria ser algo assim: “um camangueiro meloso; aquele que apronta e depois, com uma boa lábia, convence que gosta”.
Fonte:
Por Élido Girardi,
advogado (OAB-RS nº 11.534)
Publicado em:
http://www.espacovital.com.br/
Fonte:
Por Élido Girardi,
advogado (OAB-RS nº 11.534)
Publicado em:
http://www.espacovital.com.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Agradecemos seu comentário. Críticas serão sempre aceitas, desde que observado os padrões da ética e o correto uso da nossa língua portuguesa.