27 de fevereiro de 2011

Direito do consumidor: quando até o cidadão juiz se transforma em sofrido consumidor lesado




Charge de Gerson Kauer


Conhecedor do direito, reconhecido defensor dos menos favorecidos, juiz que sentenciou muitas ações coletivas em defesa dos consumidores e atual presidente da Ajuris, nem mesmo assim o magistrado gaúcho João Ricardo dos Santos Costa escapou, como homem do povo, do descaso que empresas poderosas - como a Net - impõem aos cidadãos. Textualmente, em petição, ele admite ter se sentido como "um legítimo idiota".


João Ricardo contratou com a Net Sul Comunicações Ltda. os serviços de Internet banda larga (“Vírtua 2 megas”) e de telefonia fixa, no plano “Net Fone Promo 180”, disponibilizados, a partir de  de abril de 2006.

Dois anos e cinco dias depois, o cliente solicitou à Net a reinstalação dos serviços em sua nova residência, localizada no mesmo prédio, um andar abaixo, para onde se mudara. Penou no "call center", mandou e-mails e faxes, ficou sem os serviços, foi cobrado abusivamente e só então foi informado de que deveria assinar outro contrato, porém mais oneroso.


Só em 2 de junho, acatando uma ordem judicial, a Net restaurou os serviços.


A juiza Rosaura Marques Borba, da 4ª Vara Cível de Porto Alegre, condenou a Net a devolver em dobro o valor cobrado durante o período em que o consumidor ficou sem os serviços. Fixou multa diária de R$ 500,00 para cada um dos cinco dias em que a empresa demorou para cumprir a ordem judicial de reinstalação dos serviços. E deferiu reparação moral de R$ 8 mil.


Apelou a Net, obtendo sucesso parcial, na 10ª Câmara Cível do TJRS. Mantidos os demais comandos da sentença, a reparação moral foi reduzida para R$ 4 mil.


O relator Paulo Roberto Lessa Franz explicou a redução numa longa frase. "Demonstrada a abusividade do ato praticado pela ré, e levando em conta as condições econômicas e sociais do ofendido, qualificado na exordial como ´magistrado com assento na 16ª Vara Cível do Foro Central´, e da ré, reconhecida empresa de grande porte; considerando principalmente, a reprovabilidade da conduta desta; o caráter coercitivo e pedagógico da indenização; os princípios da proporcionalidade e razoabilidade; tratando-se de dano moral puro; e que a reparação não pode servir de causa a enriquecimento injustificado, considerando ainda não ter sido o autor inscrito nos órgãos restritivos de crédito; é de ser reduzido o montante indenizatório fixado na sentença para R$ 4.000,00 que se revela suficiente e condizente com as peculiaridades do caso e aos parâmetros adotados por este órgão fracionário em situações análogas".


Com o trânsito em julgado, a Net - ante o deferimento de penhora on line em suas contas bancárias, fez na semana passada o depósito da condenação. Incluindo a honorária e as custas, a cifra chegou a R$ 10.420,51. Saiu barato para a empresa.


As advogadas Ana Paula Dalbosco e Renata Pozzi Kretzmann atuaram em nome do magistrado-consumidor. (Proc. nº 70033008681).


O desabafo em Juízo


Um trecho da petição inicial da ação do juiz João Ricardo contra a Net contem candentes desabafos reveladores de como sofre o consumidor comum:


"O autor perdeu horas em telefonemas com a ré e cada vez que obtinha evasivas e respostas ´padrão´ sem o mínimo de seriedade, sentia-se como o ´legítimo idiota´, na reiterada e sempre vã tentativa de que alguém levasse seu pedido a sério.


Nesse quadro onde pontificavam a arrogância, a insensível burocracia, a ameaça e o abuso, a resultante não poderia ser outra que não os sentimentos de impotência, de desânimo, de medo e de ira, que atuam deleteriamente sobre o psique e a saúde física do autor.


Este se vê forçado a recorrer ao Poder Judiciário como última chance de restabelecimento das obrigações contratuais descumpridas, já estressado psicologicamente, com as sequelas psicossomáticas daí derivadas".

 Nota deste blog:

 O caso relatado serve de consolo para todos os consumidores, pois até mesmo um Juiz de Direito se sente lesado pelos sucessivos casos de ofensa aos direitos assegurados aos consumidores brasileiros.
 Apenas como observação, não compreendemos a insistência de os nossos Juizes e Tribunais em arbitrar/reduzir os montantes pleiteados nas ações de danos morais, sob argumento de que a indenização não pode dar causa ao enriquecimento ilícito a quem sofreu o dano. Se por um lado isso de fato pode ocorrer, de outro, é preciso analisar se a quantia arbitrada não é por demais irrelevante àquele que praticou a ofensa, deixando a condenação (valor arbitrado) de possuir o seu principal efeito, que é o de inibir que a pratica o dano moral seja reiterada pelo seu agente.

 Diante disso, indagamos:

1- será que para a maioria das grandes empresas não é mais economico pagar as eventuais (poucos são os que reclamam) e ínfimas condenações que ela possa sofrer, do que gastar para efetivamente bem atender o consumidor?

2- será que o dano moral do Juiz atacado só vale R$4.000,00?

3. será que para um empresa poderosa R$4.000,00 representa alguma coisa?


Por que o brasileiro não reclama? Porque ele acredita que, se ninguém reage, é melhor ele também não reagir. Essa é a conclusão de um novo estudo sobre a notória passividade nacional -MARTHA MENDONÇA E RONALD FREITAS.


Leia a respeito no link:


http://mpcidadania.ning.com/group/itabuna/forum/topics/por-que-o-brasileiro-nao


Fonte:

(1) - O artigo acima foi reproduzido neste blog mediante autorização expresssa do site Espaçovital.com.br, onde foi originalmente publicado;


(2)- Para ler a íntegra da sentença do caso relatado acesse:


http://www.espacovital.com.br/noticia_complemento_ler.php?id=2268¬icia_id=22427

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