7 de fevereiro de 2011

O assassinato do idioma português



O caso que abaixo reproduzimos foi publicado no site espacovital.com.br.

O homem de 46 anos chegou à delegacia pedindo para falar, urgente, com o delegado e exibindo uma petição. Introduzido no gabinete da autoridade, apresentou o requerimento.

Ao conferi-lo, o delegado notou que o documento (?) tinha muitos erros de português e arranhava questões técnicas de Direito. Desconfiado, o policial pediu que o visitante apresentasse sua carteira da Ordem.

O pseudo advogado respondeu que "havia esquecido em casa", mas informou o número de registro que supostamente seria o seu. Garantiu ser formado na Universidade Federal de Minas Gerais, turma de 1995.

Ao investigar, a polícia descobriu que o número de OAB não existia e que o visitante já era procurado por falsidade ideológica.

Os erros cometidos pelo suposto profissional eram, no geral, de concordância. "Um dos casos mais graves foi a expressão ´desejamos sermos atendidos com brevidade nesse contesto emerjencial´" - contou o delegado, referindo-se à "peça".

E foi nesse contexto de inconcordâncias verbais e erros de grafia, que o visitante requeria ao delegado um "hábeas corpos" (assim mesmo - corpos, substantivo masculino, plural, que - no vernáculo - significa "tudo o que ocupa espaço e constitui unidade orgânica ou inorgânica", ou "cadáver; tronco humano").

Na remessa do inquérito ao Foro de Salvador (BA), por "exercício ilegal da profissão", o delegado fez um complemento: "o acusado devia também ser denunciado por homicídio ao idioma português”.

O processo está com vista ao Ministério Público para apresentar denúncia. Por exercício ilegal da profissão - claro

Nota:

Utilizamos do caso acima para destacar que o Art. 34, XXIV, do Estatuto da Advocacia e a OAB, diz expressamente que constitui infração disciplinar incidir em erros reiterados que evidenciem inépcia profissional. Diante disso, se a peça processual elaborada pelo falso advogado fosse na verdade redigida por um profissional inscrito nos quadros da OAB, tal fato poderia acarretar-lhe a suspensão da sua inscrição nos quadros daquele Conselho até que ele se submetesse a nova prova e viesse demonstrar aptidão para o exercício profissional.

Nesse contexto vale a pena cita Ruy de Azevedo Sodré (1) para o qual "a obrigação do advogado militante, é a de estudar o direito, aperfeiçoando, continuamente, os seus conhecimentos jurídicos. A vida do advogado se resume num contínuo e permanente estudo".

E MAIS:

"A ignorância, para o advogado, representa dupla falta: uma para consigo mesmo e outra para o cliente. Uma afetando a sua própria consciência, como uma obrigação ética que é, e outra, de natureza profissional, atingindo a pessoa do cliente, pois este – dando crédito ao diploma de que o advogado é portador, gerando, por isso, a presunção de conhecimentos técnicos-jurídicos – entrega-lhe ou a sua liberdade, ou a sua honra, ou os seus bens".Por derradeiro, e arrematando com chave de ouro o presente post, reproduzimos na íntegra, pelo seu caráter elucidativo, decisão emanada da 2ª Câmara do Conselho Federal da OAB, ementado nos seguintes termos:

"A arte de advogar não se completa com a expedição de um diploma universitário. Tampouco se contenta com a colocação no papel de um conjunto de frases ligadas a algum fundamento jurídico. Advogar razoavelmente pressupõe, pelo menos, um mínimo de domínio do vernáculo, bem como, uma pretensão deduzida em juízo de forma satisfatória, capaz de gerar expectativa de êxito para o constituinte, no embate judicial. Para tal desiderato, a prudência do profissional aponta para, ao menos, uma perfunctória revisão de linguagem, antes da entrega da obra acabada. A ausência desses cuidados mínimos justifica a suspensão preventiva do exercício profissional, não só porque os erros reiterados estejam a evidenciar inépcia profissional, mas, sobretudo, porque estes, como verdadeira doença que se dissemina, pela sua repercussão negativa, irão contagiar a dignidade da advocacia (art. 70, § 3º, da Lei 8.906/94)".

(1) "A Ética Profissional e o Estatuto do Advogado" – São Paulo: LTr, 1975, p. 121.

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