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O
cenário é uma cidade do interior e o acontecimento da noite é a despedida de
solteiro de Pedro, doutorando médico. Primeiro da turma que iria casar, ele
conta seus planos, enquanto o violão entra noite adentro, muita cerveja
rolando. A algazarra naturalmente incomoda alguém da vizinhança, que aciona a
polícia.
Escapole
um daqui e outro dali, sobra só o noivo, que é levado incontinenti à presença
do delegado. Este - com o rosnar típico de autoridade de cidade interiorana -
dá uma ordem sintética ao inspetor plantonista:
-
Recolhe o cara!
Lá
fora o silêncio, mas logo a turma vai se reunindo num banco da praça.
Estudante
de Direito do quinto ano, filho de desembargador do TJ estadual, Mário tem que
saber como arranjar um jeito de soltar um preso e enfrentar o delegado. E Pedro
vai até sua casa, para lavar o rosto, mascar uma folha de mastruz para tirar o
odor da cachaça e caprichar na vestimenta quase monocromática, em tons de
marrom claro e bege.
Diante
do policial, temeroso que aquilo não fosse dar certo, Mário chega tímido e com
todo o respeito. Mas o delegado é taxativo:
-
Lugar de arruaceiro é na cadeia, tá preso e vai ficar.
Mário
posta-se ao lado da mesa da autoridade e convicto dá uma rápida aula de suposta
jurisprudência:
-
Senhor delegado, noivo não pode ser preso na véspera do casamento! É matéria
recém sumulada no nosso tribunal, justamente a partir de um precedente fixado,
há poucos meses, pelo Supremo, criando a imunidade do noivo no período
prénupcial de três dias e nos cinco dias que se seguirem às bodas... São oito
dias de garantia constitucional!
O
delegado faz um ar de surpresa, alisa a vasta cabeleira e retruca:
- É eu sei, mas esse tava abusando; só mandei recolher pra dar o susto. Mas vou soltar em consideração a ti, jovem conhecedor das mudanças da jurisprudência, e até porque eu não quero arranjar enrosco com o tribunal.
- É eu sei, mas esse tava abusando; só mandei recolher pra dar o susto. Mas vou soltar em consideração a ti, jovem conhecedor das mudanças da jurisprudência, e até porque eu não quero arranjar enrosco com o tribunal.
* *
* * *
Liberado,
Pedro vai para sua residência curar a ressaca. Casa dois dias após. Todos os
amigos participantes da noitada estão presentes na solenidade das bodas.
Dois
anos depois, Mário faz concurso para a magistratura, sendo aprovado
destacadamente. Hoje é juiz na mesma cidade em que, por decorrência de uma
jurisprudência inexistente, mas habilmente inventada, o noivo terminou
beneficiado por uma interpretação semelhante à que não permite que eleitores
sejam presos às vésperas das eleições. E Pedro é hoje um dos principais médicos
da cidade.
No
folclore da comarca, operadores do Direito batizaram o caso de
"imunidade do noivo".
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