Os anos passam e, a cada ano, sempre que se aproxima o dia 25 de
dezembro, me vem à mente uma cena inesquecível que marcou os natais
quando meus pais eram vivos.
Após o almoço, com toda a família reunida, meu Pai
se posicionava estrategicamente para fazer a distribuição dos seus famosos
envelopes. Sempre na cor branca, com os nomes escritos a mão, cada um daqueles
envelopes continha uma parte do seu 13o salário. O valor da gratificação
natalina que ele recebia, como funcionário público aposentado, era integralmente
rateado em valores proporcionais para filhos, netos, afilhados e até bisnetos.
Para todos era um momento especial. Não pelo valor
recebido, mas pelo gesto que virou uma tradição natalina tão diferente das
praticadas em outros lares.
Em outro canto qualquer, minha Mãe resmungava.
Dizia que aquilo não tinha justificativa, e o dinheiro deveria ser guardado para
necessidades futuras. Enquanto meu Pai vivia o presente, minha Mãe só pensava
no amanhã.
Meu Pai faleceu. Logo no primeiro Natal sem a
presença dele, após o almoço, não é que minha Mãe, para surpresa de
todos – que antes condenava a distribuição daquele dinheiro-, apareceu com
os mesmos envelopes e fez a distribuição de toda a importância que ela havia
recebido, como pensionista do meu Pai.
Indaguei a ela o motivo de sua decisão. Ela
simplesmente me respondeu: - Não vou deixar que aquilo que fazia bem ao seu
Pai deixe de ser praticado.
E assim ela fez até morrer.
Os envelopes deixaram de ser distribuídos com a
morte de ambos, mas na minha mente eles continuam sendo entregues a cada ano
em forma de proteção que recebo do meu Pai e da minha Mãe.
Saudade, quanta saudade daquele tempo.
NOTA:
Estou republicando a pedido de alguns leitores.
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