21 de fevereiro de 2012

Jesus era peripatéti​co


Crédito da Imagem - paulolima.net



Vale a pena reproduzir o texto de Max Geringher. 

Numa das empresas em que trabalhei, eu fazia parte de um grupo de treinadores voluntários.

Éramos coordenados pelo chefe de treinamento, o professor Lima, e tínhamos até um lema:

"Para poder ensinar, antes é preciso aprender" (copiado, se bem me recordo, de uma literatura do Senai). Um dia, nos reunimos para discutir a melhor forma de ministrar um curso para cerca de 200 funcionários. Estava claro que o método convencional: botar todo mundo numa sala, não iria funcionar, já que o professor insistia na necessidade da interação, impraticável com um público daquele tamanho.

Como sempre acontece nessas reuniões, a imaginação voou longe do objetivo, até que, lá pelas tantas, uma colega propôs usarmos um trecho do Sermão da Montanha como tema do evento.

E o professor, que até ali estava meio quieto, respondeu de primeira. Aliás, pensou alto:

- Jesus era peripatético...

Seguiu-se uma constrangida troca de olhares, mas, antes que o hiato pudesse ser quebrado por alguém com coragem para retrucar a afronta, dona Dirce, a secretária, interrompeu a reunião para dizer que o gerente de RH precisava falar urgentemente com o professor. E lá se foi ele, deixando a sala à vontade para conspirar.

- Não sei vocês, mas eu achei esse comentário de extremo mau gosto, disse a Laura.

- Eu nem diria de mau gosto, Laura. Eu diria ofensivo mesmo, emendou o Jorge, para acrescentar que estava chocado, no que foi amparado por um silêncio geral.

- Talvez o professor não queira misturar religião com treinamento, ponderou o Sales, que era o mais ponderado de todos. Mas eu até vejo uma razão para isso...

-Que é isso, Sales? Que razão?

-Bom, para mim, é óbvio que ele é ateu.

-Não diga!

-Digo. Quer dizer, é um direito dele. Mas daí a desrespeitar a religiosidade alheia...

Cheios de fúria, malhamos o professor durante uns dez minutos e, quando já estávamos sentenciando à fogueira eterna, ele retornou. Mas nem percebeu a hostilidade. Já entrou falando:

-Então, como ia dizendo, podíamos montar várias salas separadas e colocar umas 20 pessoas em cada uma. É verdade que cada treinador teria de repetir a mesma apresentação várias vezes, mas.... Por que vocês estão me olhando desse jeito?

-Bom, falando em nome do grupo, professor, essa coisa aí de peripatético, veja bem...

-Certo! Foi daí que me veio a ideia. Jesus se locomovia para fazer pregações, como os filósofos gregos também faziam, ao orientar seus discípulos. Mas Jesus foi o Mestre dos Mestres, portanto a sugestão de usar o Sermão da Montanha foi muito feliz. Teríamos uma bela mensagem moral e o deslocamento físico... Mas que cara é essa?

- Peripatético quer dizer "o que ensina caminhando"

E nós ali, encolhidos de vergonha. Bastaria um de nós ter tido a humildade de confessar que desconhecia a palavra que o resto concordaria e tudo se resolveria com uma simples ida ao dicionário. Isto é, para poder ensinar, antes era preciso aprender. Finalmente, aprendemos. Duas coisas.

A primeira é: o fato de todos estarem de acordo não transforma o falso em verdadeiro.

E a segunda é: que a sabedoria tende a provocar discórdias.

A ignorância é quase sempre unânime.

Crédito:

Recebi por e-mail de Mariza Brandimarti

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